NFCs/Casa Preta/PAJELANÇA CASA PRETA
Pajelança Casa Preta
"Ewé Ni Bo Bo Ni Ti Segun Ewé Ni Bo Bo Ni Ti Orisá Ewé Ni Bo Bo Ni Ti Segun Babá" (Mãe Nalva)
"Todas as folhas tem o poder de curar. Todas as folhas dos orixás tem o poder de curar"
A Rede Mocambos e o Coletivo Casa Preta na perspectiva de garantir para essas comunidades a sua cultura, os seus costumes, a resignificação e o protagonismo da própria história, convida amigas e amigos para participar da “Pajelança Quilombólica Digital”, que objetiva fortalecer o conhecimento e empoderamento do saber livre a partir da visão africana.
Ao longo da semana, serão realizadas rodas de conversa, oficinas de vídeo, apropriação tecnológica, tambores, herbário e um dia dedicado ao debate sobre ser Mulher preta na ativa com a juventude feminina da Casa Preta convidando as mulheres pretas que inspiram suas lutas.
A Pajelança Quilombólica Digital será realizada no período de 1 a 7 de setembro na sede do Coletivo Casa Preta que fica na rua Roso Danin, 780, entre 2ª de Queluz e Juvenal Cordeiro, no bairro Canudos-Terra Firme, em Belém.
Conteúdo |
Programação Flutuante
Dia | Base | Atividade | Justificativa | Convidado |
Sábado dia:31/08 | Casa Preta | Levantando nosso barracão | Espaço na Casa para realizar nossas ações, oficinas, cineclubes, rodas de conversa... | Tod@s |
Domingo dia:01/09 | Casa Preta | Acolhida e cont. do barracão | Roletar pelo bairro e visitar as pessoas que estão na luta | Facilitadores Lamar e Guine |
Segunda dia:02/09 | Casa Preta | Acolhida e cont. do barracão | Hospedar a galera que estará colando para a pajelança | Tod@s |
Terça dia:03/09 | Casa Preta e Fórum (manhã) / Terreiro de Mãe Nalva (tarde) | Manhã: Organização da pajelança e credenciamento de quem veio pelo fórum / Tarde: Roda de conversa sobre herbário, catalogação de ervas, propriedades medicinais e espirituais, sabedoria ancestral | Dar continuidade e fluidez no processo da pajelança / O Ponto de Memória do Bairro da Terra Firme e o Museu Emilio Goeldi já possuem trabalho dentro na ilha: Projeto O Jardim Botânico Vai à Escola.Não temos terra na Casa Preta, nem um quiombo tão próximo. | Mãe Nalva/ Helena Quadros (Museu Emilio Goeldi) |
Quarta dia:04/09 | Terreiro de Mãe Nalva | Roda de conversa: Apropriação tecnológica / Atividade Prática: Triagem de máquinas (para disponibilizar para as comunidades), montagem do telecentro no terreiro. Montagem da Rádio (transmissão diária durante o evento) | Forum de Intenet Paralelo do ponto de vista do Gueto e dos Pretos, a idéia é hackear o encontro. Mas não pensamos em desfocar das atividades da pajelança e marcar território no evento. Abrir e dar espaço para o uso e manuseio de máquinas, a partir da apropriação preta tecnológica, telecentro sem internet, mas com maquinário e programas off line disponíveis. | Dj.RG/ Milson/ Ronaldo Eli/ Gilvan |
Quinta dia:05/09 | Terreiro de Mãe Nalva | Oficina de vídeo: captação e edição de imagens | Apropriação de ferramentas para registro e diversas formas de documentar momentos, histórias, vivências das comunidades | Dj.RG/ Duda Livre |
Sexta dia:06/09 | Casa Preta | Rodas de conversa: Crédito carbono / Mulher na ativa / Atividade prática: oficina de tambor "mulher" | Poucas pessoas e principalmente poucos Quilombolas sabem o que é Crédito Carbono, Jorge conhece bem o assunto e poderia deixar nítido os benefícios e os problemas com o crédito carbono / Na Casa Preta desde o começo do ano tem se conversado sobre um nucleo de Mulheres, e uma ação dentro da Pajelança poderia vir a fortacer essa iniciativa. | Jorge POA/ Maria Luiza/ Duda Sousa |
Sábado dia:07/09 | manhã: Casa Preta / noite: Jabatiteua (Terra Firme) | manhã: Limpeza do barracão pronto/ intervenções/ noite: Tambor de Crioula | vida nova ao barracão/ atividades livres/ interação e vivências com a comunidade | Tod@s/ Filhos e amigos de Cururupu (tambor de crioula) |
Dias: 31, 01 e 02
Acolhida e construção do barracão
Dia: 03/09
- Manhã: Continuação da construção do barracão, credenciamento das pessoas que vieram pelo fórum de internet.
- Tarde: Atividade no terreiro de Mãe Nalva: Roda de Conversa sobre herbário
- Relatos, Contribuições, Participações:
-Abertura: apresentação dos participantes
- Mãe Nalva: Herbário sei que vem de folha, e de folha eu conheço e falo "macumbalmente"(risos). Explica sua relação com as folhas, ervas, de forma espiritual. Ressalta a importância dessa preservação, cita exemplos em que a essa relação de culturas e desrespeito, se sobressai sobre nossos valores, mistificando as ervas e suas propriedades espirituais. Relata sobre algumas dificuldades sobre a religiosidade (candomblé) na área urbana, das questões de territorialidade. Teve uma conversa com um professor sobre ervas, e relata a importância dessas questões para a comunidade, exemplifica as formas de cura através das ervas (furada de prego se cura com cebola, para cortes, tombos se cura com óleo de copaíba, etc...), relata que essas tradições fazem parte da sua vida desde à infância, de como sua avó manuseava essas ervas, essas folhas, de tratar a família pela cura das ervas e óleos naturais (copaíba e andiroba).
Fala da parteira, da sua própria vida como parteira, da forma de como "puxar a barriga", de como essas histórias são antigas e estão se perdendo, o aprendizado ancestral, a sensibilidade. Descreve que "catinga de mulata" é uma erva de Oxum, que é a protetora do útero, de como esses princípios ativos dessa erva se relaciona diretamente com a maternidade. Afirma a importância desses saberes ancestrais, como a academia poderia contribuir com essa troca, saber ancestral (tradição e espiritualidade) e técnico (propriedades físicas, uso de ferramentas).
- Don Perna: Explica a relação da Rede Mocambos e Coletivo Casa Preta, sobre a ancestralidade, tecnologia, africanidade no que remete à tradição. A importância de reconstruir essas relações entre comunidades e saberes, como uma forma de preservar a nossa história. Apresenta e agradece a participação das pessoas, dessa troca entre terreiro (comunidade) e academia (museu Emílio Goeldi e Ponto de Memória da terra firme).
Ressalta que é fundamental esses momentos nos lugares e nas pessoas, de falar de plantas, de terra, de tambor, e que esse processo de aprendizagem é o primeiro plantio dentro das pessoas.
Esse momento de roda de conversa onde a comunidad einterage, se comunica, se articula, são as primeiras sementes que migrarão em outras rodas, que reconecta e resignifica à nossa ancestralidade. Pauta à questão da lei 10.639, em que o conhecimento ancestral e quanto a tradição, se aplica uma forma de trabalhar a "humanização (a África somos nóis)" nas escolas, é importante tratar essas questões para que as trocas de conhecimentos não sejam desvirtuados dos valores ancestrais.
- Helena Quadros: Relata o início do projeto do Ponto de Memória da terra firme, da importância desse movimento de históricos, que retratasse a vida, cotidiano e perfis dessa comunidade. Destaca às dificuldades de manter as atividades que envolvam as comunidades, à conquista de pesquisas que abraçassem essa causa, que em 2009 surge no Brasil o projeto "Ponto de Memmória" e, na época de Mário Chagas estava à frente do processo, através das lutas das pessoas da comunidade da terra firme, foi conseguido uma premiação pelas mulheres da terra firme. Para a efetivação do espaço do ponto de memória, ainda que sem recursos, foram elaboradas cartilhas, exposições...
Sugere como estratégia de trabalho mapear os pontos de cultura, uma cartografia, um mapa artístico e cultural.
Afirma como um ponto forte de espaço o Museu Emílio Goeldi (parceria estratégica), para a realização desses trabalhos. Quer levar informações sobre o herbário, para tratar das pesquisas e questões de nossos interesses.
- Milson: Fala da apropriação sobre nossos saberes, das propriedades que temos em nossas ervas, nossos frutos nossas práticas, de como esses conhecimentos se perdem e se desvirtuam das nossas vivências e protagonizações. Descreve um exemplo das práticas de terreiro e da importância do plantio das folhas de axé, como as atividades que são internas nos terreiros são de forma desreipeitosa documentados, através de fotos, vídeos e áudios.
- Guine: Explica do que se trata a Pajelança, que vem a partir de um projeto junto a Seppir, envolve também outros projetos como telecentros BR, núcleos de formação continuada, e demais projetos ligados à Rede Mocambos.
Sugere de que forma podemos trabalhar essas informações, criar espaços digitais onde se coloque essas informações, e como seriam utilizadas para a comunicação com as comunidades. De como seria a utilização e construção dessas ferramentas no processo físico, tecnológico, mapeado, cartografado, espiritualizado.
A proposta da Rede Mocambos é construir esse herbário, no objetivo de quebrar essas fronteiras territoriais, como uma forma de garantir que esses conhecimentos possam se expandir, e se compartilhar nas comunidades. A relação do direito à terra e a água, dentro de tudo que foi falado, onde se assegure os espaços de garantir às nossas tradições. Que se possa plantar e manusear as ervas, a cultura, o saber... Quando se fala da relação do uso de ferramentas tecnológicas, acadêmicas, ancestrais, é de extrema importância se ter a apropriação e garantia dessas terras, através da semente preservar essa memória, que se tem perdido nos quilombos, nas comunidades.
- Ronaldo Eli: Como reflexão, descreve a questão de como esse nosso conhecimento é apropriado, cooptado. Um fundamento/conhecimento da gente é um movimento, que sem esse movimento não faria sentido, que o saber ancestral é uma propriedade que não desapropria, independente de tercerizações de nossas experiências. Fortalecer os aspectos fundamentais dos nossos saberes, descreve sua vida e vivência no terreiro, como filho de santo de Mãe Beth de Oxum, que o cuidado é essencialmente feminino quando toma como referência à Oxum.
Sugere uma forma de pensar em como essas mulheres, comunidades, movimentos, podem trocar e viver esses saberes, que vai além do espaço físico.
- Chicona: Descreve sua satisfação por estar nesse momento, na roda de conversa. Que é muito importante para resgatar os valores e saberes que estão se perdendo, e essa troca de informações fortalecem nossas relações e aprendizados.
- Lamartine: Fala que na construção desse "herbário" que talvez nem seja um nome que contemple as casas de santo, a africanidade. Ressalta que se racializa e empreteça a botânica, através de uma troca de experiências com diversos setores, onde o resgate ancestral seja à partir das plantas, que remetem e muito nossas raízes africanas.
Galeria de fotos: O poder das Ervas
Dia: 04/09
Dia: 05/09
Dia: 06/09
Mulheres Negras na Ativa – A roda de conversa das mulheres na I Pajelança Quilombólica Digital
Texto elaborado de forma coletiva com as Mulheres Negras da Casa Preta, cada palavra aqui colocada segue uma reflexão, vivência, e negritude feminina do que foi esse momento dentro do espaço, que somos nóis. Sarah, Suhellen, Thiane, Rubia, Mina, Bruna e Maria.
O ano de 2013 tem trazido reviravoltas ao Coletivo Casa Preta, pois pela primeira vez na breve história da entidade, um grupo de mulheres começou a pensar o lado feminino dessa negritude. Essa mobilização não é recente, é resultado de uma construção individual e coletiva que culminou nesse encontro de diferentes (e divergentes) mulheres que vivem uma realidade em comum: são negras, moradoras da periferia de Belém e combatem o racismo contra a mulher negra e contra a juventude negra brasileira. Um primeiro momento pensado pelo recém formado núcleo de mulheres, que estão começando suas caminhadas na descoberta do que é ser Mulher Negra, juntas desejando e construindo momentos como esse.
Somos diferentes, cada uma com sua personalidade e experiências, mas o que nos aproxima é o mais importante... NÓS SONHAMOS! e não só compartilhamos os mesmos sonhos como estamos construindo coletivamente eles. São meninas e mulheres guerreiras à sua maneira. Doces bárbaras (pedimos licença à referência) e com doses exageradas de meiguice e de bravura. Pela primeira vez, um momento dedicado exclusivamente ao pensamento feminino negro foi realizado no Coletivo Casa Preta durante a I Pajelança Quilombólica Digital. Nos meses e dias que antecederam o evento, muito se vivenciou. Foram meses que permitiram a vivência de dias momentos e intensos completamente dedicados ao pensamento negro, de sua memória ancestral ao afro-futurismo. A rotina mudou de configuração, e essa reconfiguração nos deram mais motivos pra continuar nesse processo que vai além de uma simples formação. O desenvolvimento desse pensamento político refletirá nas ações futuras e a autoestima e a delícia do reconhecer-se passará a ser muito mais do que dizer "eu sou mulher e sou negra".
A roda de mulheres fez elas se conhecerem e reconhecerem pontos em comuns, colocarem os peitos na frente e falarem eu faço parte do coletivo casa preta e quero viver num mundo com muito mais pretas e talvez eu queira construir isso a partir daqui, desse espaço, mesmo não sendo aqui, eu modifiquei no ato de não quer ser mais só, e a cada dia quero ser coletivo Negras na ativa, de movimento constante, de um sorriso às avessas. Núcleo, grupo... Mulheres reunidas com objetivos coletivos, que trarão dias melhores à individualidade de cada uma. Vivenciar a Pajelança e a Roda de Mulheres faz refletir e sonhar cada vez maior. Proporcionou uma aproximação interna e com mulheres que são referências desses grandes sonhos. São aprendizados recebidos no simples sorrir da mais velha e de suas sábias palavras, da que veio ‘apenas’ pelo viver, daquela que naturalmente se achega pela vontade de estar. Reunir tantas e diferentes mulheres numa roda foi uma experiência que nos encheu os olhos e os desejos de grandes sonhos, de vários planos, quantas demandas e assuntos foram pensados depois dessas trocas de saber com carinhosas palavras e sorrisos. Cada uma com sua história e sua vida exposta num círculo que se acolhe e que se entende.
Ouvir das mais velhas o significado de nossas histórias, tradições e representações das mulheres que foram um tanto do que somos hoje, entender que cada processo tem suas dores e amores, que o aprendizado é constante, mas que o ser "eu mulher negra" é uma identidade que se constrói e reconstrói interruptamente sempre que enxergamos no espelho a nossa própria alma negra, resultado dessas tantas que nos antecederam. Foi a primeira de muitas rodas, onde todas e todos (os homens também participaram da roda) para a construção, formação e identidade, do respeito das diversidade humanas na luta ao excluir o racismo e preconceito. Diálogos sobre a relação Mulheres negras e o feminismo, onde até mesmo dentro de um movimento "libertário" a mulher negra ainda assim, sofre preconceito.
A casa preta, todos os núcleos e pessoas que a compõem de uma certa forma se modificaram, a casa e alguns seres esteticamente, outros mentalmente, e até de forma comportamental essa pajelança fez mudar. Muitas coisas ainda virão, essa roda de conversa foi um primeiro passo. Uma roda linda, ancestralidade aflorada na prática da oralidade. Uma Griôt (Maria Luiza Nunes – Movimento de Mulheres Negras, Cedenpa e Rede Fulanas) compartilhando memórias, aguçando nossas pesquisas, orientando e alimentando nossas lutas!
UBUNTU! "Eu sou o que sou pelo que nós somos!"
Mulheres Negras na Ativa, somos todas nós!
Galeria de fotos: Roda de Mulheres